Ventura Mina e a Guerra de Carrancas
Ventura Mina, o rei negro
Ventura Mina era escravo de Gabriel Francisco Junqueira e foi apontado como o líder e o principal articulador da revolta, ao lado de Joaquim Mina, Jerônimo e Roque Crioulos – tropeiros que viajavam frequentemente ao Rio de Janeiro e traziam de suas viagens as últimas notícias da Regência, além de armamentos para a revolta – e Damião, que se enforcou quando soube que foi denunciado.
Ventura garantiu o contato com escravos de várias fazendas da região e, na véspera da revolta, ele foi na senzala da fazenda Bela Cruz. Segundo João Leonardo Cressoil, carpinteiro daquela localidade, ele conversou com Joaquim Mina e decidiram “romper insurreição no outro dia”. José Mina, que também era escravo de Gabriel Francisco Junqueira e também foi condenado à forca, disse que havia mais de dois anos que o líder “tratava desta insurreição e lhe comunicara isto assim que seu senhor [o] comprou e o trouxe do Rio de Janeiro para esta fazenda”.
Mesmo após ter morrido em confronto, seu espírito de liderança foi repetidamente destacado tanto pelos seus companheiros de luta, quanto pelas testemunhas e autoridades da época. Nem mesmo a escassez de informações sobre ele e as versões contadas pelas autoridades judiciárias conseguiram apagar seu gênio ousado e sagaz e o fato de ter sido amado, obedecido e respeitado por todos. O Juiz de Paz de Baependi se referia à Ventura como aquele “que se havia coroado Rei”. E há especulações de que ele tenha realmente sido um rei Mina, com grande influência e ascendência sobre outros escravos, por todo o peso cultural que vinha desde a África sobre a figura do rei.
Uma revolta nas montanhas do sul de Minas
Em 13 de maio de 1833, Ventura Mina, escravo da extinta Fazenda Campo Alegre, liderou um grupo de mais de 30 escravos em uma revolta quase desconhecida que ocorreu onde hoje estão localizados os municípios de Carrancas, Cruzília e São Tomé das Letras, nas fazendas de propriedade dos Junqueira, família tradicional do sul do estado.
Os Junqueira tinham grande importância socioeconômica na região, e essa influência se dava também no campo da política. Gabriel Francisco Junqueira, o patriarca, foi deputado geral da província de Minas por vários mandatos ao longo da década de 1830. Toda essa distinção e influência da família, significava um maior ritmo de trabalho para os escravos, pois com o enriquecimento e o desenvolvimento das propriedades, havia também mais gado para cuidar e mais roças para plantar, além de cada vez mais escravos tendo que compartilhar os mesmos recursos. Na rotina das fazendas, de manhã os escravos já deveriam ter tirado o leite, alimentado os bois, as vacas e os cavalos e, à tarde iam trabalhar na roça e cuidar das inúmeras lavouras dos Junqueira: milho, feijão, arroz, fumo, etc.
Segundo registros, o número de escravos ali chegou a ultrapassar 100 cativos, que desempenhavam trabalhos variados, incluindo a atividade de tropeiro, os quais eram responsáveis pelo transporte de mercadorias, mas também de notícias.
Esses negros e negras foram sequestrados de longe, de diferentes regiões e culturas africanas, separados dos seus familiares e obrigados a encarar a realidade nos navios negreiros, e então foram desembarcados e vendidos como objetos no porto do Rio de Janeiro. Já nas fazendas do sul do estado de Minas Gerais, juntaram-se a outros negros e negras, alguns também nascidos na África, outros já nascidos no Brasil, descendentes de africanos. Na lida das fazendas, entre o sol e o chicote, o sonho e os planos por liberdade nunca deixaram de existir, pelo contrário, os escravos se organizaram e se prepararam para, naquela tarde de maio, lutar bravamente.
O grupo de escravos das duas fazendas estava determinado a exterminar todo o senhorio e sua família. Assim o fizeram e, inclusive, prepararam uma emboscada para Manoel José da Costa, genro de José Francisco Junqueira, que não estava na propriedade e foi surpreendido pelos escravos ao entrar pela porteira. Eles o mataram a bordoadas e “por fim não ficando ainda bem morto deram lhe um tiro”.
Enquanto isso, um grupo sob a liderança de Ventura, seguiu em direção à fazenda Bom Jardim, também de propriedade dos Junqueira, para realizar o mesmo feito e continuar a rebelião. Mas chegando na fazenda encontraram um forte esquema de resistência formado por João Cândido da Costa Junqueira, proprietário da fazenda que já tinha notícias do que ocorreu em Campo Alegre e Boa Vista.
Segundo Andrade, “as informações sobre os combates entre as forças repressoras e os escravos rebeldes são escassas e não mereceram muita atenção nos relatos feitos pelas autoridades da época”. Mas a justiça local fez questão de espalhar a história que mais de 30 escravos se dispersaram com o disparo de dois tiros e, de alguma forma, o líder Ventura foi gravemente ferido.
*Com informações: www.esquerdadiario.com.br