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O temido líder quilombola que inspirou a expressão “Será o Benedito?”

Benedito Caravelas (1805-1885) foi um líder quilombola que se transformou numa lenda no norte do Espírito Santo e em vários estados do Nordeste, regiões onde circulava com desenvoltura – o que lhe rendeu o apelido de Benedito Meia-Légua –, liderando grupos de negros insurgentes que invadiam fazendas para ocupar senzalas e libertar escravizados.

Nascido escravo onde hoje é a cidade de São Mateus (ES), Benedito chamava a atenção por sua devoção a São Benedito, levando sempre consigo uma medalha e uma pequena imagem do santo. E também por sua estratégia para ludibriar os capitães do mato que estavam sempre à sua procura: Benedito Meia-Légua invadia fazendas liderando pequenos grupos de ex-escravizados, para evitar grandes capturas, e sempre atacava em várias frentes simultâneas na região escolhida, o que dificultava os embates.

Outro trunfo para enganar os fazendeiros era o de vestir os comandantes de outros grupos invasores com a mesma roupa que ele usava. Quando um dos líderes era capturado, os capitães do mato acreditavam ter prendido Benedito Meia-Légua – e ele ressurgia em outro local. Por conta desse ardil, quando surgiam notícias de invasão de fazendas para libertar escravizados vinha logo a pergunta, que virou uma expressão repetida até hoje: “Mas será o Benedito?”

Sua ligação com o santo protetor chegou a lhe render a fama de imortal após um episódio ocorrido em São Mateus. Detido após uma invasão numa fazenda na zona rural, Meia-Légua foi levado para a cidade amarrado pelo pescoço e puxado por um capitão do mato montado a cavalo. Os outros integrantes de seu grupo invasor, sob ameaça de chicotes, foram obrigados a torturá-lo até a morte. Quando Benedito foi dado como morto, o capitão do mato autorizou entregar seu corpo a escravizados que acompanhavam a cena para ser velado e, depois, sepultado na localidade de Cachoeira do Cravo.

Os escravizados levaram o corpo de Meia-Légua para a Igreja de São Benedito. No dia seguinte, quando entraram na igreja, não havia corpo algum – apenas marcas de sangue que seguiam em direção a uma porta lateral da igreja. Estava criado o mito de imortal e protegido de São Benedito.

Meia-Légua não só sobreviveu à captura em São Mateus (ou o corpo retirado da igreja era de um dos seus sósias) como liderou seu quilombo e ataques a fazendas até a velhice. Foi emboscado e morto aos 80 anos, manco e doente, quando dormia em um tronco oco de árvore. Denunciado por um caçador, seus algozes esperaram o líder quilombola adormecer para tampar o tronco e atear fogo. Em meio às cinzas, seus aliados resgataram a medalha de São Benedito que ele carregava.

Após sua morte, Benedito Meia-Légua virou um herói popular entre os escravizados. Em regiões do norte do Espírito Santo e do Nordeste, até hoje são feitas encenações de Congada e Ticumbi em sua homenagem. Todo dia 1º de janeiro, na região de Colatina (ES), o cortejo de Ticumbi costuma levar uma pequena imagem de São Benedito do Córrego das Piabas até a igreja para celebrar a memória do líder quilombola.

O fato é que Meia-Légua ficou conhecido pela pergunta “Será o Benedito?” – usada até hoje para expressar o sentimento de uma situação desagradável, embora tenha surgido como bandeira de resistência à escravidão.

Curiosamente, muitos anos depois, em Minas Gerais, a expressão “Será o Benedito?” também foi atribuída à expectativa sobre a nomeação de Benedito Valadares (1892-1973) como interventor de Minas Gerais pelo então presidente Getúlio Vargas, em 1933, o que só ocorreria quatro anos depois.

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