Abdias do Nascimento
Abdias do Nascimento (Franca, 14 de março de 1914 — Rio de Janeiro, 23 de maio de 2011) foi ator, poeta, escritor, dramaturgo, artista plástico, professor universitário, político e ativista dos direitos civis e humanos das populações negras brasileiras.
Considerado um dos maiores expoentes da cultura negra e dos direitos humanos no Brasil e no mundo, foi oficialmente indicado ao Prêmio Nobel da Paz de 2010. Fundou entidades pioneiras como o Teatro Experimental do Negro (TEN), o Museu da Arte Negra (MAN) e o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO). Foi um idealizador do Memorial Zumbi e do Movimento Negro Unificado (MNU) e atuou em movimentos nacionais e internacionais como a Frente Negra Brasileira, a Negritude e o Pan-Africanismo. Quando jovem, foi membro da Ação Integralista Brasileira, onde atuou como jornalista, considerando o período fundamental para lhe “possibilitar conhecimentos sobre a cultura brasileira, arte, literatura e economia”, tendo se desligado após o fechamento legal da AIB por se opor a “um segmento sistematicamente racista contra os negros” dentro do movimento. Atuou no antigo Partido Trabalhista Brasileiro (1945-65) e foi fundador do Partido Democrático Trabalhista em 1981, chegando a ser vice-presidente da legenda a que foi filiado até sua morte.
Foi professor emérito na Universidade Estadual de Nova Iorque em Buffalo, campus de Buffalo, onde, durante seu exílio do regime militar, ele foi professor titular por dez anos. Nascimento atuou como professor visitante na Escola de Artes Dramáticas da Universidade Yale. Convidado pelo Fórum das Humanidades da Universidade Wesleyan, também nos Estados Unidos, ele participou na condição de professor visitante, com alguns dos mais destacados intelectuais da época, do Seminário “A Humanidade em Revolta”. Foi professor convidado do Departamento de Línguas e Literaturas Africanas da Universidade de Ifé, em Ifé, Nigéria. Voltando do exílio, foi deputado federal e senador da República, além de secretário do governo do Estado do Rio de Janeiro.
Biografia
Família
Filho de Georgina Ferreira do Nascimento (conhecida como Dona Josina), doceira e ama de leite, e de José Ferreira do Nascimento, sapateiro e violonista, Abdias do Nascimento era neto de mulheres escravizadas. A avó materna, Francelina, foi internada no famigerado asilo de Juquery e sofreu sérias consequências dos maus tratos lá recebidos. A avó paterna, Ismênia, nascida na África, foi estuprada por um português. Por isso o pai de Abdias “carregou, durante seus 95 anos de vida, a dor de ser um filho ‘natural’, isto é, de não ter sido reconhecido pelo pai”.
Comentando em sua autobiografia as declarações de Abdias sobre sua passagem pela AIB, o advogado e ex-deputado federal baiano Rubem Nogueira, que sobre Abdias afirmou que o “conheci de perto” durante a década de 30, sustentou que Abdias “se manteve fiel (ao Integralismo) até o fim da existência legal da AIB, motivo por que sofreu arbitrária detenção em começos de 1938”. Realmente, em fevereiro de 1938, Abdias foi detido no âmbito do Processo n° 461 do Tribunal de Segurança Nacional, ao lado de outros seis integralistas, por distribuir boletins integralistas nos últimos dias de dezembro de 1937. Segundo apurou a polícia política, Abdias teria sido, ao lado de Rômulo Almeida, o principal autor de uma derrama de boletins em edifícios no Centro do Rio de Janeiro.
Após o Estado Novo, a imprensa oficial do partido integralista que sucedeu a AIB, o Partido de Representação Popular, deu ampla divulgação às atividades de Abdias. Ele chegou mesmo a dar entrevistas para o jornal oficial do integralismo, A Marcha, na década de 1950, e foi através da editora GRD, do diretor de A Marcha, o integralista Gumercindo Rocha Dorea, que lançou seus primeiros livros na década de 1960. Segundo Gabriel Soares Predebon, isso demonstra uma continuidade das relações de Abdias com o movimento integralista. Um de seus principais aliados no TEN, Ironides Rodrigues, foi o responsável pela coluna de cinema de A Marcha entre 1954 e 1962.
Regime militar
Com o endurecimento do regime militar, Abdias exila-se por 13 anos no exterior. Na mesma época, o TEN é dissolvido e Abdias se afasta do teatro, conduzindo sua militância política por outros caminhos, tendo lecionado como professor universitário, e dedicando-se à pintura e à pesquisa de visualidades relacionadas à cultura religiosa afro-brasileira.
Durante essa época, formou junto com Gerardo Melo Mourão, Godofredo Iommi, Efrain Bo, Raul Young e Napoleón López uma aliança poética chamada La Santa Hermandad de la Orquídea. Em 1940, “os orquídeas” iniciaram sua jornada pela Amazônia passando por todos os tipos de dificuldades físicas e econômicas, de acordo com o que foi registrado por Juan Raúl Young, em uma carta de 1978 endereçada a Abdias, na qual resgata suas memórias desta viagem:
Citação: Em nosso tempo livre, Godô (Godofredo Iommi) lia para nós A Divina Comédia, escrita em italiano antigo. Godô leu, traduziu e fez sua interpretação existencialista, que era a filosofia que nos formava na época, e com ela interpretamos (A Divina Comédia) como uma jornada ontológica, ou seja, como a construção do ser de Dante.
Segundo a historiadora e intelectual negra Maria Gerlane Santos de Jesus, Abdias era uma das principais influências na luta antirracista:
A figura do Abdias Nascimento é sem dúvida emblemática no século XX e seu envolvimento na luta antirracista (e não só) é louvável, pois não temos como falar do século XX e da luta antirracista sem lembrar do nome do Abdias Nascimento, que lutou por essa causa tanto como militante, quanto intelectual, como artista. Foi influência para muitos militantes negros que a partir da década de 1970 passaram a entrar nos meios acadêmicos e assim, ao invés de verem suas histórias escritas por intelectuais predominantemente brancos, começaram, assim como Abdias nascimento, escrever suas histórias, as histórias dos seus povos.
— Maria Gerlane Santos de Jesus (2015), A representação do negro nas Revistas Veja e Isto é: Abdias Nascimento, o movimento negro e o centenário da abolição (1978-1988), Universidade do Estado de Santa Catarina.
Vida política
Após a volta do exílio (1968-1978), Abdias se inseriu na vida política ao colaborar fortemente para a criação do Movimento Negro Unificado em 1978 e como um dos fundadores do PDT em 1980.
Candidato a deputado federal pelo Rio de Janeiro em 1982, alcançou a terceira suplência, exercendo o mandato ante a nomeação de parlamentares para o secretariado do governador Leonel Brizola. Foi a primeira vez que o Congresso Nacional teve um parlamentar engajado no combate ao racismo.
Em diferentes ocasiões, Abdias precisou ser assertivo na Câmara dos Deputados. Quando um colega afirmou que não existia racismo no Brasil, ele respondeu: “Quem sabe do racismo são aqueles que o sofrem, e não Vossa Excelência, que pertence à classe dos privilegiados”.
Em outro momento, um deputado disse que era exagero afirmar que os negros eram oprimidos, já que, para ele, a opressão recaía sobre os pobres como um todo, não importando a raça. Abdias interveio: “A nossa luta de negro não está desvinculada das reivindicações dos oprimidos deste país. Mas isso não quer dizer que não tenhamos os nossos problemas específicos. Nenhum outro pobre de qualquer outra raça foi escravo por 400 anos aqui no Brasil. Somente nós”.
Morte
Abdias morreu em 23 de maio de 2011, aos 97 anos, devido a uma insuficiência cardíaca. Ele estava internado desde abril no Hospital dos Servidores do Rio de Janeiro por causa de uma pneumonia, que agravou
Pesquisa: Jose Lucas (Folha do Pirajuçara)
Fonte: https://pt.wikipedia.org