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Audiência Popular denuncia Impactos da criação do novo Rodoanel no projeto da “Nova Raposo”

A Sociedade Ecológica Amigos do Embu (SEAE) e a entidade Preservar Ambiental realizaram, nesta segunda-feira, a 1ª Audiência Popular: A Nova Raposo em Itapecerica, Embu e Cotia, NÃO!, reunindo mais de 100 pessoas, entre especialistas e moradores, para discutir o controverso projeto “Nova Raposo” que propõe construir um novo rodoanel interligando a Castelo Branco, a Raposo Tavares e a Régis Bitencourt, e seus potenciais impactos na região, traçando paralelos preocupantes com os efeitos já observados após a construção do Rodoanel.

O evento contou com a presença do Vereador Uriel Biazin, da Câmara Municipal de Embu das Artes, do Vereador Abidan Henrique, também de Embu das Artes, Ricardo Sim (SEAE), Adriana Abelhão (Preservar Ambiental), Deputado Estadual Carlos Giannazi, Ernesto Maeda (Movimento Nova Raposo Não), Marcos Ummus (Geógrafo), Carlos Bocuhy, Presidente do PROAM – Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental, William Mendes (Biólogo) e César Pegoraro, Mobilizador e Educador da SOS Mata Atlântica.

A audiência, realizada na Câmara Municipal de Embu das Artes, serviu como um contraponto às discussões oficiais, oferecendo um espaço aberto para a análise aprofundada dos riscos ambientais, sociais e econômicos associados à obra.

Rodoanel como Alerta: Impactos Previstos se Concretizam e se Ampliam

Especialistas e moradores expressaram preocupação com a possibilidade de a Nova Raposo replicar e ampliar os problemas já enfrentados com o Rodoanel, como o aumento da especulação imobiliária, a destruição de áreas de preservação ambiental e a precarização dos recursos hídricos. Todos concordaram que a Nova Raposo traz impactos ainda maiores que os do Rodoanel, uma vez que o projeto não determina que seja uma rodovia classe zero, ou seja, essa rodovia pode ter acessos diretos a propriedades, bairros, ruas locais ou vias de tráfego urbano.

Carlos Bocuhy, Presidente do PROAM – Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental, apresentou um panorama da região metropolitana de São Paulo, destacando como a expansão urbana descontrolada compromete os recursos naturais e a qualidade de vida. Bocuhy ressaltou que o modelo de adensamento urbano, aliado à priorização do transporte individual, tem levado à saturação da capacidade de suporte da região, com consequências como a escassez de água, a poluição do ar e a perda de áreas verdes. Ele alertou para a necessidade de um planejamento urbano mais integrado e sustentável, que leve em consideração os limites ambientais da região e promova a justiça social.

César Pegoraro, Mobilizador e Educador da SOS Mata Atlântica, discorreu sobre a importância do bioma Mata Atlântica e a necessidade de defender o pouco que resta, alertando sobre a perda da capacidade de preservação e retenção de água. As discussões levantaram sérias preocupações sobre a falta de um estudo de impacto ambiental aprofundado e a ausência de participação popular no processo de tomada de decisão. Ele enfatizou que o projeto, da forma como está sendo proposto, pode agravar a crise hídrica na região, aumentar a especulação imobiliária e destruir áreas de preservação ambiental cruciais para a manutenção da biodiversidade.

Efeito Espinha de Peixe e Destruição da APA

 

Estudos do INPE e do IPEA demonstram que a abertura de rodovias em áreas de preservação resulta em ocupações progressivas ao longo do tempo, efeito ‘espinha de peixe’ — padrão reconhecido por criar vias transversais com ocupação intensiva. Nos primeiros 2 anos após a implantação, a ocupação tende a ocorrer num raio de 1 a 2 km, com surgimento de vias, loteamentos irregulares e galpões logísticos. Entre o 2º e o 5º ano, a expansão atinge de 3 a 5 km, com formação de travessas maiores e crescimento espontâneo de bairros. Já no período de 5 a 10 anos, observa-se o adensamento e consolidação da ocupação até 10 km do eixo viário, muitas vezes com a ocupação total do entorno, marcando a transformação definitiva da paisagem original. Segundo Ricardo Sim, isso representaria a completa destruição da APA Embu Verde e da reserva florestal do Morro Grande.

Contestação da Legalidade e Fatiamento da Obra

Ricardo Sim acrescentou: “Nosso advogado já atestou que realizar a concessão à iniciativa privada para a construção de uma estrada sem a prévia realização dos estudos de impacto ambiental e das audiências públicas previstas em lei é ilegal porque fere diretamente os princípios estabelecidos na Constituição Federal (art. 225) e na Lei nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente), que determinam que qualquer obra potencialmente causadora de degradação ambiental deve ser precedida de avaliação de impacto e ampla participação da sociedade. Deixar esses estudos sob responsabilidade exclusiva da empresa interessada na obra compromete a isenção, a profundidade e a legitimidade do processo, pois a concessionária possui interesse direto na viabilidade do projeto, o que pode levar à minimização de impactos e à exclusão de vozes críticas. Além disso, ignora o direito da população de ser informada e de participar das decisões que afetam seu território, tornando o processo não apenas juridicamente frágil, mas democraticamente falho.”

Adriana Abelhão (Vice-Presidente da Preservar Ambiental) alertou que a criação de novas alças de acesso ao Rodoanel em Itapecerica da Serra, na iniciativa da prefeitura em conjunto com o governo do estado, é na verdade uma forma de estender ainda mais esse novo rodoanel passando por dentro da cidade e fatiando o licenciamento da obra em duas iniciativas separadas para diminuir os impactos e compensações. Adicionou que entende que a criação dessas novas alças em uma rodovia classe zero é ilegal frente a normativa no Brasil (DNIT-IPR 709/2018), que tem restrições rigorosas quanto à sua interação com o viário local.

Alternativas à Rodovia e a Importância da Fauna

Marcos Ummus, em sua análise, defendeu que talvez a melhor alternativa ao trânsito da região não seja aumentar as vias para São Paulo, mas sim criar empregos e oportunidades nas cidades da região, para que seus moradores não precisem se deslocar diariamente para trabalhar na capital. Ele ressaltou que o modelo rodoviarista, além de gerar impactos ambientais, não resolve o problema da mobilidade urbana, e que é preciso investir em soluções mais sustentáveis e que promovam o desenvolvimento local.

William Mendes, por sua vez, ressaltou que não adianta prever a construção de passagens de fauna depois do projeto pronto, como medida compensatória. Ele argumentou que o correto é entender, desde o início do planejamento, se os impactos à fauna já não seriam tão severos ao ponto de se mostrarem proibitivos para o licenciamento da obra. Mendes enfatizou a importância de preservar os corredores ecológicos e garantir a conectividade entre os fragmentos florestais, para evitar o isolamento genético das populações animais e manter o equilíbrio ecológico da região.

Conclusão

Os presentes concluíram que, embora compreendam a necessidade de enfrentar os graves problemas de trânsito da região, o projeto Nova Raposo não apresenta melhorias significativas para o trânsito ou para as dificuldades de transporte público enfrentadas pelos moradores. Em contrapartida, a obra acarreta impactos devastadores à fauna, flora, recursos hídricos e serviços ecossistêmicos de regulação do clima, afetando não apenas os moradores do entorno, mas todos os 20 milhões de habitantes da região metropolitana de São Paulo. Diante disso, a sociedade civil organizada deve concentrar esforços para garantir que esse novo rodoanel não seja construído e que todos os processos da concessão sejam cancelados, até que sejam realizados estudos de impactos adequados e audiências públicas em cada uma das 11 cidades afetadas pelo conjunto de obras do Nova Raposo. Para viabilizar essa luta, as entidades organizadoras iniciaram uma campanha de captação de recursos para financiar o pagamento de um advogado que tomará as medidas cabíveis. Mais informações podem ser obtidas nos perfis de redes sociais da SEAE, PRESERVAR e Nova Raposo Não, ou por contato direto com as entidades.

 

(*) Rodolfo Almeida

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